A saúde emocional dos colaboradores nunca esteve tão em alta quanto nessa pandemia. E essa preocupação não fica apenas no colo do RH. Conversei com uma psicóloga organizacional e separamos nesse texto cinco dicas super importantes para você prestar atenção na sua empresa.
Passados pouco mais de cinco meses desde que a pandemia se estabeleceu em nossas rotinas impondo o isolamento social e alterando radicalmente o dia a dia de todos, já é possível estabelecer alguns marcos – ou ondas – e, mais, vislumbrar caminhos, mesmo que ainda estejamos imersos em incertezas. É na relação entre times e, sobretudo, na experiência diária dos colaboradores em que podemos notar os impactos mais contundentes.
E para falar sobre a saúde mental desses profissionais e o que está acontecendo nas organizações – e projetar próximos movimentos – conversei com a psicóloga Odaice Formagge, que compartilhou com a gente um pouco do que tem visto nas organizações com as quais atua.
Se ainda é tudo muito recente e as pesquisas ainda não dão conta de consolidar e traduzir os últimos meses, a experiência da especialista traz luz a cinco pontos fundamentais para a compreensão do que enfrentamos, dos desafios que ainda virão e de como a Comunicação Interna pode ser usada como uma ferramenta de aproximação, conexão, empatia e engajamento.
1) O “novo normal” já é realidade
Nada mais verdadeiro que o clichê “nada será que como antes”. Os impactos do isolamento e o processo acelerado de deslocamento das rotinas para modelos de home office causaram uma ruptura sem volta à antiga normalidade.
“O antes e depois [da pandemia] já é fato! As pessoas já estão adoecendo. Não apenas pela enfermidade ou perda de pessoas, mas por inúmeros outras questões ligadas à pandemia e ao home office”, conta Odaice.
Para a psicóloga, é revelador a alta incidência de síndromes como de burnout e de estresse pós-traumático. O distúrbio, antes associado a pessoas que passaram por experiências extremas, agora surge de forma bastante difundida, em um contexto de pequenas fissuras emocionais.
“Há perdas, há luto, mas também há o medo, que se instalou em muita gente, não somente da doença, mas outros tantos. De repente nos vimos diante de um acúmulo para o qual ninguém estava realmente preparado e que gerou uma soma de estressores muito grandes”, complementa.
2) Home Sweet Home Office
Num primeiro momento, o home office foi encarado como um “sonho de consumo”, uma solução a mão. São muitos os seus pontos positivos, mas, como não foi possível uma etapa de transição, a mudança repentina nas rotinas se somaram a outros fatores, causando dores silenciosas, bastante individualizadas, para as quais não estávamos preparados.
Odaice lembra que, já de início, entre março e abril, a eminência da crise econômica nos colocou em certa suspensão. O medo de perder o emprego, a sensação de não ser visto trabalhando e, portanto, a necessidade de “mostrar trabalho”, em combinação com outros fatores, deu início a um preocupante processo de adoecimento em muitos profissionais.
O mantra, nesta primeira onda, era que precisávamos criar uma rotina. As pessoas incluíram novas ocupações. O sentimento era de que era preciso aproveitar o tempo. Para a psicóloga, essa percepção de tempo é ilusória, “pois veio junto dela uma autocobrança muito grande que deflagou uma disparada nos níveis de ansiedade”, reforça, “ao mesmo tempo, o trabalho remoto nos colou em uma situação de disponibilidade informal que rapidamente virou trabalho além do horário, anulando a já tênue fronteira entre casa e trabalho.”
Em uma segunda onda, muitas dessas pessoas já fragilizadas se depararam com um dia a dia cada vez mais duro em suas casas. Muita gente não conta com estrutura domiciliar adequada e, então, “começaram a vir à tona uma série de conflitos interpessoais antes adormecidos, agora, agravados pelo isolamento e as 24 horas de convívio”.
3) A importância do papel das empresas
Odaice vem atuando como consultora no enfrentamento aos distúrbios de saúde mental junto a diversas empresas e vê como muito positivo o fato de que elas estejam se empenhando em mapear e agir contra os malefícios da pandemia no campo pessoal de seus empregados. Já são incontáveis os webinars que participou. Ela conta que
“foi nas empresas que surgiram os primeiros movimentos de resposta aos problemas. Muitas perceberam logo de início o que estava acontecendo e agiram. Outras vieram em seguida e são cada vez mais empenhadas em entender e aliviar o estresse, além de se colocar como suporte ao funcionário, abordando temas muito importantes como alimentação, atividades físicas, sintomas, relacionamentos e outros mais”.
4) Um futuro de legados e desafios
Impossível prever o que virá pela frente ou até quando a realidade pandêmica irá se impor. A atual fotografia é de afrouxamento das restrições e muitas empresas dão os primeiros passos no retorno gradativo aos escritórios. Mas, para Odaice, independente de acontecimentos mais ou menos objetivos, algumas projeções são bastante factíveis e devem estar desde já no radar das organizações.
Tudo de positivo que o home office e outras modalidades de interconexão nos trouxeram, sem dúvida, se tornarão tendência e serão melhor aproveitados pelas empresas em benefícios de seus negócios, pessoas e sociedade. Mas a especialista lembra que “os problemas psicológicos também irão perdurar em um cenário pós-pandemia”.
“A forma como lidamos e superamos tanta dificuldade é essencialmente individual. É muito delicado tratar o tema de forma genérica. Como cada um absorveu e seguirá a vida independe da natureza do que passou, as reações serão múltiplas e todo cuidado será necessário para detecção de quadros de depressão, burnout e outros tantos danos psicológicos”, comenta
5) Liderança Presente
Para Odaice, outro legado será a preocupação legítima e criteriosa das empresas com a saúde emocional de seus funcionários. Muito do sucesso que as empresas irão conseguir nessa missão passa pelo papel de suas lideranças.
“Como disse, os problemas serão fundamentalmente individualizados, portanto, é necessário olhar com atenção para a liderança, que precisa ser trabalhada para aprender a entender os outros, a praticar a empatia, saber o que o outro está passado, tudo muito individual, entendendo as diferenças, olho no olho”.
Independentemente do que o futuro nos reserva, quanto antes as organizações se anteciparem a esses desafios anunciados, maiores são as chances de reduzirmos traumas, aproveitarmos ao máximo o de bom pode ser extraído de tempos tão difíceis e que, finalmente, nos tornemos pessoas e organizações melhores e mais sensíveis ao próximo.