As desigualdades de gênero são históricas na América Latina e no Brasil em termos ocupacionais, sobretudo se mencionarmos que ainda hoje, as mulheres constituem minoria nas ocupações de maior status, como, por exemplo, cargos de alta gerência e posições executivas, além dos boards de diretores.

O Brasil caiu 26 posições em 15 anos no ranking global de igualdade de gênero, divulgado no Fórum Global em março de 2021. Entre 156 nações avaliadas, o Brasil ocupa o 93º lugar. Em 2006, o país estava em 67ª lugar. A Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD), desde 2016, mostra a mesma ladainha, que as mulheres brasileiras dedicam o dobro de horas semanais na jornada doméstica, fator que continua impactando diretamente na trajetória profissional da mulher, e é reflexo de um machismo estrutural da nossa cultura latino-americana.

A McKinsey que estuda a diversidade nas empresas há mais de 10 anos mostra que desde 2016 temos visto na América Latina a mesma tendência: as mulheres são promovidas a gerentes em taxas muito mais baixas do que os homens, criando um gargalo nas organizações. Como consequência, as mulheres ainda são minoria na posição de CEO, diretora de board ou mesmo executiva de segunda ou terceira linha.

A minha própria história de empreendedorismo foi uma saída que encontrei para não depender da morosa progressão de carreira que as mulheres enfrentavam nos idos de 90. Hoje eu sinto muito orgulho de fazer parte do universo de mais de 30 milhões de mulheres que administram um negócio próprio no país, provavelmente porque sentiram mais confiança em si mesmas do que nos programas de carreira existentes. Esse grupo representa quase metade da força empreendedora do país, segundo o Global Entrepreneurship Monitor.

Apesar da área de comunicação ter mais mulheres em número, claramente, os homens, mesmo em minoria, sempre desfrutaram de promoções mais rápidas em suas carreiras. Imagine isso há  25 anos atrás.  Os cargos de diretoria, em grande maioria, mantinham-se ocupados por homens nessa época.

Depois de passar pela Editora Abril e outras agências de comunicação, eu logo percebi que poderia acelerar meu crescimento profissional se optasse por abrir minha própria agência de comunicação. Fundei a Trama Comunicação em 1996 com apenas 26 anos e formei uma equipe composta exclusivamente por mulheres, que se manteve assim por muitos anos. Creio que o primeiro homem contratado na agência entrou depois de uns 5 ou 6 anos. Na liderança estava eu e minhas sócias Helen Garcia e Sandra Bonani, que criamos um modelo de gestão mais humanizado, no qual o colaborador estava sempre no centro de tudo e se diferenciava bastante do restante do mercado. Além disso, preferíamos contratar mulheres ou colaboradores da comunidade LGBTQI+, entendendo que isso também contribuiria para dar mais voz a esses grupos nos projetos de comunicação. E por ironia, na época, a maioria das agências de comunicação era presidida por homens, principalmente as agências internacionais. Sempre que um novo colaborador entrava em nossa agência nosso clima organizacional era altamente elogiado.

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De alguns anos para cá, diversas pesquisas mostraram o que já sabíamos de forma empírica, que as empresas presididas por mulheres têm climas melhores e também resultados melhores.  Estudo da McKinsey publicado em 2019 indicou que tanto a diversidade de gênero quanto étnica, tem clara correlação com aumento de rentabilidade. Em janeiro de 2020, a Goldman Sachs saiu na frente e anunciou que não conduziria mais processos de abertura de capital (IPO) de empresas que não tenham pelo menos uma mulher no conselho. A verdade é que hoje as empresas brasileiras e as estabelecidas no Brasil, apesar do machismo estrutural latino-americano, perceberam que podem ter problemas se não tiverem mulheres nos conselhos e diretoria. E essas empresas podem ter riscos reputacionais e riscos de perder participação no mercado porque estão para trás dos concorrentes em termos de inovação e resultados.

Apesar de todos os indicadores favoráveis, o estudo da McKinsey ano após ano ainda mostra que a promoção de mulheres é mais lenta em relação a de homens e isso torna quase impossível para as empresas estabelecerem uma base para o progresso sustentado em níveis mais altos. A verdade é que temos ainda avanços tímidos. Estamos limitadas ao número cabalístico dos 30: nem 30% de mulheres em C-Level, nem 30% de mulheres em conselho, nem 30% de mulheres investidoras.

E você, que atua com comunicação, como está contribuindo para mudar esse cenário atual?

Sempre encarei a comunicação como uma área na qual temos uma oportunidade ímpar de quebrar paradigmas, preconceitos e mudar práticas que certamente farão do mundo um lugar melhor e de menor desigualdade de gênero. Depois de ter como área de estudo no mestrado na ECA-USP o tema da inovação e a diversidade, passei a acreditar na pluralidade de visões para construir pontes entre pessoas e marcas. Ainda temos hoje menos homens do que mulheres na agência, inclusive nos cargos de liderança. Mas hoje em nossa cultura organizacional acreditamos que, quanto mais plural somos, mais fortes e inovadores nos tornamos. Por isso, valorizamos nossas diferenças.

O mercado da comunicação, por muito tempo liderado por homens, vem sendo cada vez mais dominado por mulheres nos últimos anos. Vozes inovadoras e inteligentes, que também empoderam outras mulheres, já são realidade nas mais diversas estruturas e na adoção de estratégias de comunicação diferenciadas.

Se você deseja para o mundo um ambiente mais igualitário e justo de trabalho, tudo isso deve estar refletido em suas atitudes e na postura consultiva que nós, como comunicadoras, temos que oferecer para as empresas que atendemos, conscientizando-os constantemente da importância de combater a desigualdade de gênero e das inúmeras vantagens de ampliar cada vez mais a diversidade no ambiente de trabalho.