*Fábio Pires de Andrade
Israel é um Estado com escassos recursos naturais, possui pouco mais de 9 milhões de habitantes e, constantemente, é pressionado por um conflito geopolítico histórico. No entanto, investe 4,93% do seu PIB em pesquisa e desenvolvimento, o que equivale a mais de US$13 bilhões por ano, de acordo com a Israel Innovation Authority, o que o torna o país que, proporcionalmente, mais destina recursos para essa finalidade.
Embora o território israelense seja relativamente jovem e tenha se estabelecido apenas em 1948, o país se construiu à sombra da milenar cultura judaica. Essa raiz étnica e religiosa tem diversas implicações que sustentam três pilares: educação, ciência e tecnologia e inovação.
Qual o resultado disso? Israel possui mais startups, cientistas, engenheiros, patentes médicas, gastos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e profissionais em tecnologia per capita do que qualquer outro país do mundo. Tel Aviv, por exemplo, é a sétima colocada em um ranking que leva em consideração as melhores cidades do mundo para se começar uma startup. Com isso, o governo também criou um arcabouço jurídico sem igual para garantir que mais parcerias público-privadas venham à tona. Ao mesmo tempo, as universidades têm foco em ciência aplicada e pesquisa de produtos, pois elas se financiam, sobretudo, com os royalties gerados.
Mas você deve estar se perguntando, o que o setor de transporte de cargas nacional tem a ver com Israel? Tive o privilégio de compor o grupo de executivos do setor de transporte brasileiro que esteve em Israel, no último mês de agosto, a convite da Confederação Nacional do Transporte (CNT). O objetivo da visita ao país foi promover uma imersão no ecossistema de inovação israelense e abrir caminho para novas parcerias e negócios.
É inquestionável que temos um país com dimensões continentais com realidades e desafios diferentes e isso traz oportunidades, mas ao mesmo tempo grandes desafios em infraestrutura, um caminho fundamental para um país que busca o desenvolvimento econômico. Sempre acreditei que entraves como o da infraestrutura não nos impede, enquanto empresa, de fazer a nossa parte e olhar para dentro de casa, atentos à evolução do mercado, para buscar alternativas que refletem na entrega rápida e eficiente, focando na melhoria dos processos, valorização das pessoas e resultados positivos.
A partir da imersão na “Nação Startup” essa crença se fortaleceu e eu tive a certeza do quanto uma empresa pode fazer a diferença quando a barreira da inovação é rompida. Inovar requer desprendimento para arriscar e isso esbarra no viés cultural, está aí a grande vantagem dos israelenses que não relacionam o sucesso monetário com o êxito de inovação. Essa cultura de comercialização completamente diferente do restante do mundo é que faz a diferença ao atrair grandes empresas para instalar seus negócios em solo israelense tornando-o o polo de tecnologia.
Não é mais possível ignorar o emprego da tecnologia nas operações diante da digitalização e do surgimento de competidores digitais vorazes por modelos de negócios disruptivos – ótimos para consumidores, mas péssimos para companhias tradicionais que não inovam. No setor de transportes essa transformação digital tem levado mais tempo do que deveria, em razão dos problemas estruturais que esbarram nos valores e costumes da sociedade. Ouso em dizer que a inovação de costume não acompanha a inovação tecnológica.
De qualquer maneira, existem empresas, governos e startups pensando em soluções para o ramo. Algo que precisa ficar claro é que o bom uso de tecnologia nos transportes públicos, rodoviários e de carga não significa apenas ter um aplicativo de interface que conecta pessoas. Vai muito além disso: usar a tecnologia para segurança, gestão de carga e armazém, integração e otimização de sistema, além de empregar o processo de inovação nas empresas de forma cultural. Precisamos entender como utilizar recursos que já existem, para outros fins, de forma que o investimento em tecnologia tenha um ROI (Retorno Sobre Investimento) ainda maior.
Aqui no Grupo Rodonaves nós acreditamos que por meio do fomento da cultura de inovação, fortalecemos internamente as nossas raízes e conseguimos dar a nossa contribuição para o futuro do TRC (transporte rodoviário de cargas). Voltei de Israel com a certeza de que estamos no caminho certo, visto que um investimento de R$ 244 milhões, no biênio 2021/2022, foi empregado na companhia concentrados em inovação e tecnologia. Trago na bagagem a lição de casa e posso garantir que temos muito a conquistar, evoluir e contribuir com o setor mantendo a sustentabilidade do negócio e parcerias estratégicas.
O que aprendi? Temos que educar para inovar e a tecnologia é uma consequência disso. Um caminho sem volta que exige olhar estratégico e desprendimento para apostar no que é novo e disruptivo também no setor de transporte de cargas.
*Fábio Pires de Andrade é COO da RTE Rodonaves