Investimento de 10 bilhões de dólares anuais em áreas mais vulneráveis, resultaria numa redução de mais de 40 bilhões de dólares na Saúde, mesmo assim o Brasil está atrasado em 20 anos para assegurar água e esgoto tratado para todos
Para apoiar o País no desafio de garantir acesso à água e esgoto para toda a população, o Instituto de Engenharia (IE) acaba de lançar uma proposta com as diretrizes para universalização do saneamento no Brasil.
Segundo relatório da SNIS, de 2018, a falta de água tratada e saneamento básico favorecem a rápida circulação de vírus letais pelo mundo colocando países como o Brasil, no qual 53,7% vivem sem acesso à coleta de esgoto e 35 milhões sem acesso à água potável, em um cenário de alta vulnerabilidade.
“Nosso intuito foi colaborar com a definição de diretrizes para superar as deficiências brasileiras e nossa instituição defende que as medidas propostas sejam iniciadas imediatamente”, afirma Eduardo Lafraia, presidente do Instituto de Engenharia.
O Estudo realizado pelo Instituto de Engenharia, sob responsabilidade da Divisão Técnica de Engenharia Sanitária, Recursos Hídricos e Biotecnologia, traz medidas de curto, médio e longo prazos com responsabilidades direcionadas, separadamente, às esferas federal, estaduais e municipais e aos diversos atores da sociedade, inclusive destacando o papel essencial da mídia na conscientização da população, para que o País possa cumprir, embora com significativo atraso, um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, que é assegurar a disponibilidade e a gestão sustentável da água e saneamento para todos.
O trabalho reuniu e compilou propostas extraídas a partir de entrevistas com 23 profissionais com experiência diversificada no setor de saneamento e de consultas a entidades públicas e privadas.
São elencados, no documento, as prioridades e os caminhos para superar as deficiências brasileiras nas quatro áreas que compõem o saneamento: abastecimento de água; coleta, tratamento e destinação de esgotos; coleta e destinação de resíduos sólidos; e drenagem urbana.
Série de webinar do Instituto de Engenharia
O IE será um centro de discussões sobre o saneamento no segundo semestre de 2020 com webinars que vão ter profissionais de entidades e empresas que vão ser cruciais na mudança deste cenário no País. A primeira edição aconteceu no dia 6 de julho, com presença do BNDES e da Assemae.
Cenário atual é de crise hidro-sanitária frente ao COVID-19
O Brasil tem 100 milhões de pessoas (53,7%) que vivem sem acesso à coleta de esgoto e 35 milhões sem acesso à água potável. E ainda, convivem com os 3.257 lixões a céu aberto existentes no País, segundo Abetre (Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes).
O simples ato de lavar as mãos com água e sabão, para a prevenção de doenças como a COVID-19, torna-se impossível quando não se tem água tratada. Não obstante, doenças de veiculação hídrica, poderiam ser evitadas com a coleta e o tratamento dos esgotos, aumentando a quantidade de leitos hospitalares e, também, de profissionais da saúde disponíveis no País.
O estudo considera que o investimento em saneamento geraria uma grande redução nos gastos com a saúde. Segundo a OMS (Organização mundial de saúde), a cada dólar investido em saneamento, US$ 4,3 são economizados no setor de saúde. Assim, o estudo indica que um investimento de 10 bilhões de dólares anuais em regiões de maior incidência de doenças de veiculação hídrica, resultará numa queda superior a 40 bilhões de dólares nos custos para tratamento de doenças.
A superação das deficiências na área de saneamento depende de um esforço coletivo de Governos, nos três níveis, e dos três poderes, modernizando as estruturas públicas, legais e operacionais do setor.
O estudo mostra que igualmente importante – particularmente no momento atual em que o Poder Público sofre forte restrição de recursos – é a participação da iniciativa privada, investindo na instalação e modernização dos sistemas de saneamento básico e tratamento de resíduos, seja na forma de concessões puras ou parcerias público-privadas (PPPs).
Além disso, investimentos em saneamento podem contribuir, significativamente, para a geração de empregos diretos e indiretos no Brasil, pós pandemia. Esse setor, como é apresentado no estudo, pode empregar técnicos e engenheiros, além de reaquecer indústrias de insumos e empresas que prestam os mais variados tipos de serviços, tais como: consultoria, licenciamento, planejamento, elaboração de projetos, construção, operação, gestão, e formação de mão de obra especializada. O setor de turismo também pode ser beneficiado com a requalificação de áreas hoje degradadas e contaminadas.
Perspectivas para solução
“Nossa visão estabelece um horizonte de 20 anos para implantação do saneamento básico, e de 40 anos para solução das questões de drenagem, que são mais complexas. Confiamos que esse seja um prazo para chegar ao patamar dos países da OCDE”, esclarece Paula Rodrigues, coordenadora da Divisão Técnica de Engenharia Sanitária, Recursos Hídricos e Biotecnologia do IE.
“Para que não se perca o ritmo e o foco na execução da presente proposta, caberá aos governos, nos três níveis, estabelecer planos de curto, médio e longo prazos, com prioridades claras e metas quinquenais regionalizadas”, explica a organizadora do estudo Paula Rodrigues.
A proposta do IE é que essas ações sejam feitas a partir de uma avaliação multidisciplinar e com a participação de Universidades, Instituições de Pesquisa, entidades públicas e privadas, e sociedade civil; mantendo-se sempre o foco na saúde, no ambiente e na qualidade de vida.
O estudo considera indispensável a atuação da mídia, das escolas e das entidades sociais para a conscientização da sociedade sobre a importância do saneamento ambiental para a saúde da população e para um meio ambiente sadio.
Aponta, ainda, que o desafio do Brasil para atingir padrões internacionais na área de saneamento depende das várias Engenharias, tais como a Sanitária, a Ambiental, a Civil e a Química; além dos diversos profissionais ligados ao setor.
Segundo o Lafraia, o novo estudo faz parte do Projeto Brasil, uma série de estudos da entidade, que cumprem o compromisso do IE de “promover a Engenharia em benefício do desenvolvimento e da qualidade de vida da sociedade brasileira”.
Alguns números que apontam os problemas de saneamento brasileiros:
- O Brasil ainda tem 100 milhões de pessoas que vivem sem acesso à coleta de esgoto e 35 milhões sem acesso à água potável, segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) de 2019;
- Existem 3.257 lixões a céu aberto, segundo Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes (Abetre). Os lixões contaminam o solo e as águas superficiais e subterrâneas. Neles proliferam vetores de diversas doenças;
- Há 13 milhões de pessoas morando em áreas irregulares, segundo dados do IBGE (2016);
- 80% das águas residuais no mundo são lançadas nos mananciais sem tratamento (UNESCO, 2019);
- Só o Brasil interna anualmente cerca de 300 mil pessoas por doenças relacionadas à falta de saneamento, fonte BBC, de 2020;
- O saneamento rural está muito abaixo do mínimo necessário, se comparado com o saneamento urbano (IBGE, 2016);
- A dificuldade de acesso à água pelas populações do semiárido é enorme (INSA, 2014);
- O acesso à água pela população de rua inexiste, dados do portal Tratamento de Água de 2020.