A terceirização (ou o chamado outsourcing) é uma realidade no Brasil em diversos setores, há muitos anos. O processo vem se acentuando até mesmo em função de novas legislações trabalhistas que, revitalizadas, ampliaram possibilidades a organizações e empregadores.
Em 2018, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu ser constitucional a contratação de terceirizados envolvendo também as atividades principais ofertadas pelas empresas. Antes, só era possível terceirizar atividades como serviços de limpeza, manutenção, alimentação e segurança patrimonial, por exemplo, quando estas, claro, não representavam o core business da organização em si.
Chama pro baile, mas não chama pra dançar!
Esses novos cenários de negócios e modelos de gestão de equipes trouxeram, sem dúvida, para a área de Comunicação Corporativa complexos desafios.
Como promover uma comunicação estratégica, integrada e engajadora para colaboradores próprios e terceiros, quando os meios digitais são cada vez mais utilizados como canais de relacionamento com esses profissionais e, muitas vezes, esses terceirizados não têm acesso a eles e sequer são inclusos dentro das ações, eventos e iniciativas de endomarketing, até mesmo por conta de questões jurídico-trabalhistas?
Este é apenas mais um dos desafios do dia a dia de um profissional de comunicação. Aspectos como expedientes de trabalho em turnos alternativos, relacionamento hierárquico entre próprios e terceiros, desenvolvimento de atitudes e comportamentos por terceirizados alinhados com a cultura organizacional da empresa onde está atuando, comprometimento com o clima, entre outros, ajudam a aquecer ainda mais esse diálogo.
Para Eduardo Luiz Magalhães de Oliveira, profissional de Comunicação da Petrobras, a principal barreira encontrada é a questão da continuidade.
“Existe uma barreira tecnológica, pois muitos deles não têm acesso aos canais. Existem as questões jurídicas, mas há também a continuidade dos serviços. O que observamos, por vezes, são interrupções nas linhas de trabalho, com trocas de equipes e, assim, é mais difícil criar uma cultura sólida, longeva. Não existe o mesmo vínculo de anos que um empregado próprio da Petrobras tem”, opina.
Superar estas barreiras é fundamental para garantir uma comunicação integrada, aproximando lideranças da empresa do time de terceiros cada vez mais. Não há outro caminho por onde começar.
“Sabemos que o engajamento e comprometimento ocorrem quando o funcionário enxerga sentido entre aquilo que faz no dia a dia, os valores da empresa e as suas crenças. Quando é alguém que não se sente parte do todo, que enxerga o seu papel na organização apenas como um ‘prestador de serviços’ e que observa na liderança um grau de distanciamento, certamente ele não vai se tornar aderente aos pilares de cultura. Temos que criar uma estratégia para trazer quem está nas ‘franjas’ para a centralidade de decisões, sabendo ouvi-los, acolhendo, tal qual fazemos com os colaboradores próprios”, diz Adriano Zanni, Diretor de Engajamento e Comunicação com Empregados do Grupo Trama Reputale.
O crachá de muitos cores
No início de suas atividades como consultor em Comunicação Interna aqui no Grupo, Adriano Zanni relembra sobre um processo de diagnóstico e revitalização da matriz de canais de comunicação interna que vivenciou em um cliente da área de tecnologia da informação ligado a um grande banco com atuação global.
“Quando planejávamos os eventos e ações de endomarketing do cliente, a primeira pergunta que fiz ao gestor de comunicação foi: o quanto você inclui seus terceiros nesse sistema? O quanto você os conhece de fato e os traz para dentro da sua cultura?”, relembra.
Ele conta que, neste momento da reunião, muitas fichas caíram e os agentes decisores da empresa de TI notaram que havia diversas barreiras comunicacionais e de gestão que precisavam ser sanadas, caso a organização realmente quisesse trabalhar engajamento e clima junto a seus terceiros, que representavam cerca de 30% do quadro funcional.
“Essas pessoas terceiras tinham uma cor de crachá diferente das demais, não eram convidadas para os rituais de celebração, eventos internos ou ciclos de capacitação. Sentiam-se totalmente exclusas. O resultado? Muitos pediam para se desligar e não pensavam duas vezes em trocar de oportunidade de trabalho, mesmo ganhando bem ou fazendo aquilo que mais gostavam. Isso gerava custos para a empresa, que contava com esse contingente para entregar os projetos”, avalia Zanni.
Para Eri Yoshiy, gerente de Atendimento do Núcleo de Comunicação Interna do Grupo Trama Reputale, os terceiros também fazem parte do time, contribuindo para que os objetivos e as metas sejam atingidos.
“Quando eles se sentem envolvidos, pertencentes e conectados, com certeza, vão trabalhar mais felizes, comprometidos. E, se por um lado, os colaboradores ficam com uma sensação positiva, de acolhimento e bem-estar, por outro, a empresa terá um profissional com bom rendimento e entregas de excelência, que estará ao seu lado para vencer os desafios. E que, inclusive, poderá convidar a fazer parte do seu quadro futuramente”, diz.
Segmentar a comunicação é a chave
É claro que nem todas as informações devem ser levadas para todos os públicos de uma empresa. É preciso segmentar os temas de interesse e escolher adequadamente os canais que melhor atingem cada stakeholder interno, considerando as questões de natureza jurídico-trabalhista também.
Entretanto, é possível envolver os terceirizados em campanhas de saúde e segurança, em ações motivacionais e de sensibilização ou, até mesmo, em eventos comemorativos. Se tudo tiver lastro e alinhamento, o resultado caminha sempre para a positividade.
“A inclusão, certamente, é a principal ação. Então, se por exemplo, a empresa está distribuindo um brinde devido a uma data comemorativa ou fazendo uma degustação de um produto para seu público interno, os terceiros podem recebê-lo também e fazer parte dessa experiência. Se eles fazem parte do time, ainda que sejam de outras organizações, por que não podem fazer parte dessas ações? Capacitá-los e educá-los sobre temas sensíveis também é uma ótima maneira de inclui-los na matriz comunicacional. Afinal, tudo isso é marca empregadora. Eles serão embaixadores daquela empresa da porta para fora”, reflete Eri.
E para conseguir um resultado mais efetivo, é preciso conhecer melhor o público interno, com pesquisas e contato direto com as lideranças. “Devemos manter uma preocupação ativa, constante, de enxergar a comunicação interna de forma ampla, percebendo que os terceirizados têm uma realidade completamente diferente dos empregados próprios. Temos tentado ouvi-los de forma correta, avaliar o impacto da comunicação interna sob o ponto de vista deles. E não partindo de pressupostos”, complementa Eduardo Oliveira.
Uma nova safra
Outras empresas também demonstram essa constante preocupação com sua força de trabalho. Recentemente, a CHS, empresa do agro, nosso cliente do Núcleo de Comunicação Interna, deu um passo ainda maior no relacionamento com os terceirizados. A cooperativa norte-americana e que contrata muitos safristas no Brasil em períodos de colheita, decidiu absorver todos os terceiros, abrindo oportunidades locais.
“Nós temos muito orgulho de dizer que absorvemos a gestão de todos os terceiros da CHS. Nosso principal motivo foi a importância que nós damos às pessoas. Os safristas, em especial, sempre estiveram na linha de frente, mexendo com a soja, fazendo o processo acontecer. Antes, fazíamos um grande esforço para envolver todos em nossas campanhas e ações de comunicação, mas enfrentávamos dificuldades no processo. Por isso, esse é um momento de grande alegria para nós”, comemora Cláudio Borges, gerente de Recursos Humanos.
Este projeto envolveu um grande esforço do time da CHS, mas já trouxe muitos benefícios, como afirma José Olívio, analista de Recursos Humanos por lá.
“Como temos uma gestão direta sobre eles, agora ficou mais fácil conversar diretamente, colher informações, saber onde podemos melhorar, ter ações mais assertivas. Diminuímos a rotatividade e melhoramos a vida dessas pessoas. Os safristas estão engajados, trabalhando mais felizes”.
“Certamente, nem todas as empresas têm condições de seguir o exemplo da CHS, por diferentes motivos, mas tendo em vista que a terceirização continuará sendo uma realidade no Brasil, é possível extrair lições do que a área de Comunicação deve empreender daqui para frente: conhecer as particularidades e valorizar os diferentes perfis de públicos internos com os quais tem que lidar, tirando muitos deles da invisibilidade”, conclui Adriano Zanni.